As ondas de calor que atingem o Brasil durante o verão têm provocado preocupação crescente entre especialistas em saúde cardiovascular. Com temperaturas que frequentemente ultrapassam os 35 °C em diversas regiões, o organismo humano é submetido a um estresse térmico intenso, que exige adaptações rápidas e pode desencadear eventos graves, especialmente em pessoas com doenças cardíacas prévias ou fatores de risco.
Segundo dados do Cardiômetro da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), mais de 248 mil mortes cardiovasculares foram registradas no país em 2024. Embora nem todas estejam diretamente relacionadas ao calor, cardiologistas ressaltam que as altas temperaturas funcionam como um gatilho capaz de agravar quadros existentes e precipitar emergências.
Por que o calor afeta tanto o coração
Quando o ambiente ultrapassa os 35 °C, o corpo precisa dissipar calor para manter uma temperatura interna estável. O cardiologista Tito Paladino explica que esse processo exige um esforço adicional do coração, que passa a bombear mais sangue para a superfície da pele, onde ocorre a troca térmica por meio da transpiração.
Esse mecanismo torna-se ainda mais complexo porque, sob calor intenso, os vasos sanguíneos se dilatam. A dilatação reduz a pressão arterial, levando o coração a acelerar os batimentos para compensar a queda.
Pessoas saudáveis geralmente conseguem lidar com essa adaptação, mas quem tem insuficiência cardíaca, doença coronariana ou hipertensão pode não tolerar bem esse aumento de demanda, o que abre espaço para arritmias, infartos, descompensações e até síncopes.
O papel da desidratação e da viscosidade sanguínea
Outro fator crítico é a desidratação, que ocorre de forma mais rápida no verão. A perda excessiva de líquido aumenta a concentração de eletrólitos no sangue e o torna mais viscoso, dificultando o trabalho cardíaco. Quanto mais espesso o sangue, maior o esforço para bombeá-lo pelos vasos.
Além disso, a redução do volume circulante pode comprometer a perfusão de órgãos vitais e precipitar quedas abruptas da pressão arterial, especialmente em idosos e pessoas que fazem uso de diuréticos ou medicamentos para hipertensão. Em situações extremas, a combinação de desidratação e sobrecarga térmica leva ao chamado “choque térmico”, condição potencialmente fatal.
Quem corre mais riscos durante as ondas de calor
Embora todos estejam sujeitos aos efeitos das altas temperaturas, alguns grupos apresentam maior vulnerabilidade. Idosos, crianças, hipertensos, diabéticos e pessoas com doenças cardíacas preexistentes têm menor capacidade de termorregulação e podem desenvolver complicações mais rapidamente.
Trabalhadores expostos ao sol, como profissionais da construção civil, agricultura, entregadores, agentes de trânsito e trabalhadores informais, também compõem um grupo crítico de risco. Nessas populações, a combinação de esforço físico intenso, perda hídrica e exposição solar prolongada aumenta significativamente o risco de exaustão pelo calor, desmaios e eventos cardiovasculares.

Sinais de alerta que exigem atenção imediata
Reconhecer precocemente os efeitos do calor sobre o sistema cardiovascular pode evitar desfechos graves. Palpitações, tontura, fraqueza, dor no peito, falta de ar e confusão mental são sinais importantes de sobrecarga. Qualquer um desses sintomas durante exposição ao calor deve ser tratado como alerta.
O surgimento de sede intensa, pouca urina, pele seca e alteração no nível de consciência pode indicar desidratação severa, que exige hidratação urgente e retirada do indivíduo para um ambiente fresco. Ignorar esses sinais pode resultar em agravamento rápido e colapso cardiovascular.
A forma mais eficaz de prevenir complicações é manter hidratação constante ao longo do dia, mesmo sem sensação de sede. Água é a escolha ideal; bebidas alcoólicas e ricas em cafeína devem ser evitadas, pois intensificam a perda de líquidos.
Atividades físicas ao ar livre devem ser realizadas preferencialmente antes das 10h ou após as 17h, quando a radiação solar e a temperatura ambiente são menos intensas. Em dias de calor extremo, reduzir o ritmo dos exercícios ou optar por ambientes climatizados é a alternativa mais segura.
Roupa leve, protetor solar, refeições equilibradas e períodos estratégicos de descanso também contribuem para diminuir a carga térmica sobre o organismo.
Cuidados redobrados para pessoas com doenças cardíacas
Para quem já tem diagnóstico de doença cardiovascular, o calor representa um desafio adicional. A recomendação é seguir rigorosamente a medicação prescrita, evitar exposição prolongada ao sol e manter ambientes climatizados sempre que possível.
Qualquer mudança nos sintomas habituais, como maior cansaço, inchaço, falta de ar ou dor no peito, deve ser comunicada imediatamente ao médico responsável.
Cardiologistas reforçam ainda a importância de ter um plano de ação para dias extremos: saber quando procurar ajuda, manter contato atualizado da equipe médica e ter acesso rápido às medicações necessárias.
O calor extremo é um fenômeno que se intensifica ano após ano e já faz parte da realidade climática brasileira. Conhecer seus efeitos sobre o sistema cardiovascular permite que as pessoas se protejam melhor e previnam complicações que, muitas vezes, poderiam ser evitadas com medidas simples.
Informação, vigilância e cuidados básicos transformam o verão em uma estação de bem-estar e não em um risco adicional à saúde do coração.













